Capítulo 18

AS 4 A 5 MIL SUBSTÂNCIAS DO CAPÍTULO 7


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"Crâne à la Cigarette"

Pintura de Vincent Van Gogh 1885
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É, parece difícil de acreditar. Num trocinho branco que queima, temos a possibilidade de entrar em contato com mais de 4.700 substâncias. E, o pior, a cada dia que passa descobrem-se mais elementos tóxicos adicionados ao fumo, que entram em contato com as nossas entranhas, sejamos fumantes ativos ou passivos (e, há estudos que já falam em mais de seis mil substâncias).

Cito aqui, para falar destas entranhas, um pequeno exemplo desta intimidade, num informe do Hospital Infantil de Toronto (Canadá) : foram encontrados resíduos de nicotina e cotinina em fios de cabelos de 23 bebês cujas mães não consumiram tabaco, mas respiraram a fumaça dos maridos ou colegas de trabalho, durante a gravidez. Os bebezões só tinham entre 1 e 3 dias de nascidos, quando foram tirados uns bocadinhos de cabelo. As mães aspiraram uma fumaça que não era delas e a nicotina chegou até a pontinha dos cabelos dos filhos que ainda estavam dentro de suas barrigas.

Aliás, por falar em cabelos, saibam que estudos recentes realizados na Inglaterra, em Lancashire, constatam que o fumo contribui, tanto para que os cabelos fiquem brancos, quanto para um maior aparecimento de calvície, os populares "carecas, poucas telhas, aeroporto de mosquitos, etc".

Destas milhares de substâncias inaladas, não há referência a que qualquer delas possa fazer bem à saúde, apesar do que poderíamos pensar, desavisadamente, assistindo a um comercial de cigarros. E olhem que são próximo de cinco mil substâncias. Pela beleza dos anúncios, seria de se esperar que pelo menos algumas tivessem uma propriedade especial, mágica mesmo. Talvez, seja porque a ciência ainda não tenha evoluído em suas pesquisas. Quem sabe não seremos surpreendidos em breve com a notícia de que após sucessivos ensaios chegou-se à descoberta revolucionária das propriedades de um determinado componente?

Por enquanto, no atraso científico em que ainda nos encontramos, todas as misturas provocadas pelo ato de fumar tem se revelado péssimas para a saúde.

 

Venha para o mundo de Marlboro

Imaginem, bem atentamente, a situação escolhida "livremente" pelo futuro fumante. Ele decide inalar dia após dia, ano após ano, década após década, milhares de substâncias ruins para a sua saúde (e ainda paga por isso). Ele decide enfiar goela abaixo, até a ponta dos fios do cabelo, como vimos, substâncias que vão lhe diminuir o fôlego, estreitar suas artérias e veias, trazer-lhe o câncer, um buraco no estômago ou torná-lo banguela.

É o único dos animais terráqueos a tomar uma iniciativa deste porte, uma auto-poluição sem precedentes. O avô da minha amiga Iara, sempre que a vê fumando, comenta que todas as chaminés que ele conhece colocam fumaça para fora, que jamais viu chaminé por fumaça pra dentro, como a neta. A poluição existente em uma cidade industrial em pleno funcionamento é café pequeno, se comparada à poluição tabágica.

Isto está próximo a uma tentativa lenta de suicídio ou, então, a valentia do psicopata que, desarmado, desafia um exército. Nossa força está em nosso pensamento, é inútil crermos poder enfrentar tamanha agressão química sem causar graves danos a nós mesmos e aos que nos rodeiam. Somos frágeis, nos queimamos com fósforos (e, dói para caramba), nosso pensamento, nossas decisões, é que podem ser fortes. Dependendo de nosso equilíbrio interior e da quantidade de conhecimento armazenado.

 

Já foram identificadas mais de 60 substâncias cancerígenas participantes deste processo. E v. sabem qual o câncer que mais mata os homens? É claro, o câncer de pulmão! Lá, para onde a fumaça vai diretinho, sem escalas. Em algumas regiões do planeta, nos países do primeiro mundo, o câncer de pulmão já tornou-se o primeiro câncer a matar mais também nas mulheres.

Os homens assumiram a liderança porque fumam, em escala industrial, desde a Primeira Guerra Mundial. As mulheres só agora estão morrendo de câncer de pulmão, porque começaram a fumar em grande escala só a partir da Segunda Grande Guerra. Estas informações não aparecem nos belos anúncios de cigarros. Já pensaram, se as campanhas fossem dizer a verdade: "gatona, fume o da nossa marca, você terá o seu câncer de pulmão igualzinho a um homem!!" Imaginem uma cena com uma mulher do tipo avançada, de vanguarda, protestando: "abaixo estes machos opressores, queremos ter o direito de ter nosso câncer de pulmão igual ao deles". Ou, então, mostrassem um paciente indo para a sala de cirurgia operar um câncer de pulmão, dessem um close nele dizendo: "tenha seu câncer também, para alguma coisa termos em comum". Poderia, ainda, ser outro paciente com um catéter de oxigênio no nariz: "percebes a minha decisão inteligente de fumar". Não, é óbvio que estas cenas nunca serão mostradas.

Vocês podem pensar "...como este mané é exagerado !" Posso garantir que não estou sendo. Cito aqui dois exemplos para que vocês entendam porque insisto em que a fumaça do cigarro pode ser assassina: Wayne McLaren e David McLean morreram de Câncer de Pulmão, em 1992 e 1995. Vocês sabem qual a profissão deles? Modelos. Os dois foram, em momentos diferentes, os cowboys dos anúncios dos cigarros Marlboro. "Os homens se encontram na Terra de Marlboro". A viúva de David, Lilo McLean, entrou com processo na justiça contra a companhia de cigarros que encomendava as propagandas. No processo, alega que para que uma tomada do filme ficasse boa, eram necessários vários dias de filmagem, obrigando seu marido a fumar 3 a 4 maços de cigarro por trabalho, para que o diretor do comercial achasse a melhor posição da fumaça. Cruelmente, David e Wayne se encontram (precocemente) em baixo da terra, e não na de Marlboro. 

mclarenwayne

Wayne McLaren, em dois momentos: modelo dos cigarros Marlboro e morrendo por Câncer de Pulmão. Sempre que penso nestas duas fotos, eu fico irado contra o fumo.

Tomo a liberdade de trocar fome por fumaça, em uma frase do compositor Caetano Veloso (de quem sou tiete assumido):

" Gente é pra brilhar, não pra morrer de fumaça !".

Um tumor invadindo e obstruindo a traquéia, restando uma passagem mínima para o ar. Um sufoco totalmente desnecessário, sofrimento causado pelo maior encurtador de vida conhecido, o TABACO.

Reproduzo aqui, dados que recebi da Sociedade Americana do Câncer (American Cancer Society), que impressionam a quem lida com o combate ao tabagismo mas, que ao mesmo tempo, nos estimulam a lutar, ainda com mais vontade, pois, é o que nos espera, no Brasil, se não nos mobilizarmos rápido: estimativa de americanos mortos por Câncer de pulmão nos Estados Unidos, em 1997: 94.400 homens e 66.000 mulheres. Portanto, estima-se que 160.400 pessoas morreram deste tipo de câncer, apenas em um país, em 1997, sendo que o tumor de pulmão está na liderança das mortes tanto entre os homens quanto entre as mulheres. O mesmo relatório informou que o Câncer de pulmão já representa o segundo tipo de tumor mais diagnosticado nos EUA, ficando atrás apenas do de mama entre as mulheres e, o de próstata entre os homens.

Kamil yavuz © Turquia

Não tenho dúvidas do quanto deve ser difícil para vocês se interessarem por estes temas que estamos tocando agora, falando de doenças, canceres e buracos no estômago. Jovens, vigorosos e com interesses tão distantes disto. Confesso que não sei como me colocar melhor do que estou tentando fazer. Peço apenas, para vocês não encararem estas mensagens como tentativas de repressão. Todos que lidamos com a idéia do "não começar a fumar", sabemos do perigo que é o entendimento errado da mensagem. Afinal, todos fomos adolescentes, nunca é demais lembrar. Contudo, que fique também claro que vocês adolescentes não devem absolutamente nada aos que patrocinam seus festivais de Rock ou de Jazz. Não devem nada mesmo. Isto para eles é só uma forma de angariar a simpatia e mascarar a essência. O produto que eles querem vender para vocês tem mais de quatro mil substâncias tóxicas. É disto e só disto, que se trata! Todos nós, conscientemente ou não, sabemos que o cigarro faz mal à saúde. Eles não querem muito, só querem que vocês provem. O resto, o tempo e a nicotina se incumbem. As indústrias de cigarro ganham muito dinheiro em troca do investimento. Não se sintam devedores em hipótese alguma! Cuidem de vocês, porque vocês acham que devam se cuidar, não porque eu, seus pais, professores ou, quaisquer outros dinossauros, possamos estar sugerindo. Reúnam-se e discutam este assunto entre vocês, sem preconceitos.

Bom, voltando às danadas das substâncias, como são milhares, têm para todos os efeitos. E, como passeiam por todo o organismo, podem atingir desde os olhos, provocando a cegueira por catarata ou por alteração da retina e, até a bexiga, provocando câncer. Gastrite, úlcera de estômago ou do intestino, câncer do rim e do pâncreas, são doenças, hoje em dia, claramente associadas ao tabagismo. Como o trajeto é direto, até chegar aos alvéolos, câncer da boca e do laringe são figuras clássicas em qualquer estudo. Câncer de esôfago e do colo do útero, idem.

O enfisema pulmonar e a bronquite crônica levam o indivíduo a progressivamente ficar inválido, totalmente dependente de auxílio de parentes e amigos, para as mais elementares atividades como, por exemplo, pentear o cabelo ou fazer cocô. Não pensem que estou exagerando, pois, lido com isto diariamente. A publicidade do cigarro nunca mostra estas cenas, claro. A partir de um certo momento, a permanência em hospitais passa a ser de uma frequência assustadora.

Após um determinado período de intoxicação, é comum detectarmos várias doenças associadas no fumante. Por exemplo, ao se diagnosticar um Câncer de pulmão, os exames também mostram que o paciente está com Enfisema pulmonar. Muitas vezes, o segundo diagnóstico impede o tratamento do primeiro, i.e., não pode operar o Câncer do pulmão (que é um dos tratamentos para esta doença), porque não tem capacidade respiratória suficiente, por causa do Enfisema. Isto se aplica a várias situações entre as doenças relacionadas com o fumo. A pessoa tem um Infarto do coração, trata-o, faz "ponte de safena" e depois aparece com um Câncer de bexiga ...

© Kamil Yavuz, Cartunista - Istambul, Turquia

Estes milhares de substâncias podem aparecer pelas mais diversas causas. Podem ser agrotóxicos usados na lavoura do fumo, podem ser inseticidas usados para proteger as folhas, podem se desenvolver durante a própria queima do fumo do cigarro ou do papel que o envolve. Esta queima se dá entre 800 a 1200 graus celsius, temperatura da brasa da ponta do cigarro. A tal temperatura inúmeras substâncias se combinam, desencadeando o surgimento de novas substâncias (por pirólise ou pirossíntese), antes inexistentes na fumaça.

Para combater a idéia de que o fumo era um perigo, após os estudos sobre a associação fumo-câncer de pulmão, divulgados em torno de 1950, para não perder clientes, a indústria de cigarros lançou os filtros, os cigarros com filtro. Em 1950, menos de 1% dos cigarros tinham filtro. Já em 1960, mais da metade deles era produzida com os filtros. Sabe-se hoje, que a existência dos filtros não diminuiu o número de mortes pelo tabagismo, ao contrário, apesar da redução do alcatrão, aumentou a mortalidade pelas doenças do coração e cérebro, pelo incremento em 30% do teor de monóxido de carbono na fumaça. Além disso, fibras do filtro (acetato de celulose) são aspiradas pelo fumante, com repercussão ainda pouco estudada.

Jornal do Brasil, 18 / fev / 2002.

A intoxicação por pesticidas usados na lavoura do fumo está deixando os trabalhadores brasileiros doentes. Portanto, as substâncias do tabaco já estão fazendo mal às pessoas mesmo antes de virarem cigarros, cigarrilhas e charutos.

tabaco2.jpg (15803 bytes) Processo de secagem das folhas de tabaco.

Campanha autraliana

What is your poison?

É o suficiente para fazê-lo ficar doente. Muito doente.


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